POESIA GOIANA
Coordenação de SALOMÃO SOUSA
JOAQUIM THOMAZ LOPES
(Brasília, Distrito Federal, Brasil)
Nasceu em Pirenópolis (Goiás) em 1927.
Cursou o ginasial no Ginásio Anchieta em Silvânia (GO).
Foi presidente do Grêmio Recreativo Castro Alves e redator e diretor do jornal estudantil "O Ateneu".
Bacharelou-se em Direito em 1952 pela Universidade do Brasil no Rio de Janeiro.
POEMAS & POETAS I. Capa: Cristina Camacho. Rio de Janeiro: Litteris Editora Ltda., 1989. 119 p. 14 x 21 cm.
Ex. bibl. Antonio Miranda. - Doação do livreiro Jose Jorge Leite de Brito, em 2021.
A SECA NORDESTINA
Que tédio enervante, que vida de monge,
ouvindo o soluço das rodas ao longe
e as lentas pancadas das horas que passam,
enquanto lá fora, nos céus e na terra,
na vila e no campo, no vale e na serra,
há cenas dantescas de um drama de horror.
A seca é terrível, as chuvas não vêm,
os campos secaram e as águas também,
só resta esperar — ou a chuva ou a morte.
O sol escaldante que tudo abrasar,
não há uma sombra que possa abrigar,
que as folhas, de secas, há muito caíram.
Os grandes incêndios crepitam nas matas,
lembrando os fragores de antigas fragatas,
nas lutas heroicas dos tempos de antanho.
São troncos ruindo, são galhos quebrados,
chiados de folhas, de insetos queimados,
num caos infernal, de fumaça e de cinzas.
Os cedros gigantes estrondam e estalam,
e unindo os seus galhos, sem chamam resvalam,
mil figuras de foto lambendo os seus pés;
e grossas colunas de fogo e poeira,
subindo do inferno da imensa fogueira,
se perdem longínquas nos plainos de anil.
Nas secas macegas, as brancas ossadas
das reses famintas, pra sempre tombadas,
de fauces abertas, gargalham sinistras,
enquanto bem pero, no fundo de um vale,
na magra carcaça de um velho cavalo,
os corvos festejam, no horrendo banquete.
Os fracos rebanhos, peludos, terrosos,
Aos corvos famintos, fitando chorosos,
meditam na sina fatal que os aguarda;
E em vendo as ossadas que o campo semeiam,
mugindo tristonhos, saudosos pranteiam,
os mortos queridos que a seca abateu.
Ao pobre caboclo nem prato lhe resta,
aos olhos cansados, nem sombra de festa,
que diga de outrora seus dias melhores,
Plantado na porta do tosco casebre,
contempla impassível, tremendo de febre,
seus campos crestados, seu gado a morrer.
Aos filhos — coitados — prostrados no chão,
fraquinhos, doentes, sem roupa e sem pão,
que resta da vida? —Só resta morrer,
nos seios mirrados, sugando sem quê,
o tenro filhinho de fome fenece.
No leito em que outrora corria um regato,
cantante e fresquinho, lá dentro do mato,
— só poças de lama, pejadas de vermes.
E o homem delira, de bruços no chão,
um pouco de lama asquerosa na mão,
Febril e sedento, sugando-a, com ânsia.
A morte na terra campeia, sem tréguas,
— Aqui, os incêndios, por léguas e léguas,
— Ali, grassa a fome entre as febres mortais,
E o sol abrasante castiga, sem pena,
da terra na face — Qual Deus do Geena —
Lançando sem raios, mil setas de fogo.
Na boca das grotas há mudos lamentos,
seus bordos vermelhos são lábios sangrentos
que imploram, trementes, as gotas do céu.
Os galhos já secos são braços gigantes,
erguidos, em súplica, aos céus tão distantes,
ao último brado da lenta agonia.
E Deus não se apiada, não vê quantas dores,
no céu infernal desse quadro de horrores,
será que não sente, será que não?!
Senhor das alturas, tem pena, tem dó,
escuta esses brados erguidos do pó,
que a vida na terra se esvai, pouco a pouco!
E a terra poreja, sedenta e abafada,
os braços erguidos, a fronte abrasada,
um pouco de chuva pedindo ao Senhor.
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Página publicada em julho de 2021
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